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Um bonde chamado design

por Editoria ℓiⱴε
Nov 6th, 2018 » 9 min (Design) (Interview)

Nova York é o ponto de encontro de uma dupla de designers brasileiros que têm desenvolvido projetos para o Brasil a partir da Big Apple: Leo Porto e Felipe Rocha. O primeiro a desembarcar em NY foi Leo, que deixou São Paulo com o objetivo de estudar na School of Visual Arts (SVA), sete anos atrás.

Hoje é senior designer na Collins, uma companhia de estratégia e brand experience. Também vindo da capital paulista, Felipe chegou a Nova York há três anos. Com trabalhos desenvolvidos desde os 17, ele tinha enviado um e-mail para a Sagmeister & Walsh, um renomado estúdio de design, pedindo para trabalhar. E a estratégia deu certo. Ficou na empresa por dois anos e atualmente é senior art director no Spotify.

Leo havia feito alguns estágios antes de se formar em Design na SVA e ingressar na Collins – antes de partir para NY, esteve também na Y&R, época em que ainda achava que seu caminho era a publicidade. Felipe atuou em São Paulo, chegando a abrir um estúdio de design gráfico, e na Itália, ao ser convidado a trabalhar na Fabrica, laboratório criativo da Benetton.

Em Nova York, foram apresentados por um amigo em comum e, algum tempo depois, passaram a morar juntos e desenvolver projetos de design como uma dupla. “Começamos a trabalhar juntos, bem por acaso. Um foi ajudando o outro em projetos”, conta Felipe, lembrando a parceria que se estabeleceu dois anos atrás. O acaso acabou se tornando uma rotina, com uma demanda alta de jobs. Tanto que a dupla tem de ser bastante criteriosa na definição dos projetos.

Um ponto que chama atenção dos clientes brasileiros é a vivência internacional dos dois, o que lhes confere pensamento mais global. “É trabalho global, mas entendemos os desafios brasileiros”, esclarece Leo. Além disso, o duo tem na bagagem expertises de estratégia e de branding. Entre os trabalhos assinados por eles estão Melissa e sua marca Flygrl e o projeto de branding da ℓiⱴε (mais detalhes do case estão abaixo).

E há outro projeto que foi além do trabalho da dupla, avançando para a comunidade de criativos brasileiros que vivem na cidade americana. É o Bonde, uma plataforma de conexão materializada na rede social e por meio de um evento que foi organizado em julho do ano passado. A ideia surgiu como forma de reunir os profissionais brasileiros localizados em Nova York. De fato, era para ser um encontro de designers, porém a conclusão da dupla é que seria importante criar uma plataforma para divulgar projetos brasileiros para uma audiência global. E então foi aberto um perfil no Instagram (@bonde.br), hoje com mais de 11 mil seguidores.

O encontro virou conferência, que se abriu para outros profissionais criativos. Na pesquisa que fizeram para a montagem do evento, Leo e Felipe encontraram nomes fora do design gráfico que poderiam compor a grade. Assim, entraram na programação palestrantes como os grafiteiros Rimon Guimarães e Zeh Palito e o artista plástico Jonathas de Andrade, que vive no Recife e que teve exposições individuais em Nova York, Toronto, Florença e Lisboa, entre outras cidades. Foram convidados para participar da conferência porque, de algum modo, eles têm o design como essência em seus trabalhos. Estiveram no evento ainda Bárbara Soalheiro, Celso Longo, Frederico Duarte, Marcelo Rosenbaum, Marina Willer, Nina Paim e Pedro Sanches.

Design brasileiro no Google

Além de conectar os profissionais brasileiros de Nova York, o Bonde tem a proposta de discutir o design em si. Um dos motivos para a criação da plataforma foi mostrar outras possibilidades da área. Esse posicionamento traz embutida uma questão: o que é o design brasileiro? “Pesquisamos no Google ‘brazilian design’ e surgiram gráficos extremamente coloridos, plantas tropicais. É uma visão muito limitada. Por isso, quisemos dar voz para outros designers”, explica Leo.

A dupla pondera que em muitas nações, como Japão e Suíça, há uma identidade forte entre o design e o país. No caso do Brasil, não há um estilo que prevaleça. Afinal, é um país com dimensões continentais, com regiões bem distintas e uma população grande. Mas pode-se dizer que há uma característica bem particular: a capacidade de o brasileiro ser criativo com recursos limitados.

Por outro lado, o mercado não utiliza a disciplina como poderia. “No Brasil, o design entra mais como ferramenta e menos como pensamento estratégico. No mundo, as marcas estão colocando mais dinheiro em design”, afirma Felipe. Para Leo, seria importante que o design brasileiro conseguisse mesclar dois universos que perceberam na análise de portfólios do mercado: a atenção e a dedicação de arte e a aplicação de conceitos em escala mais comercial. Isso porque, em geral, o que se vê são trabalhos para grandes marcas – o que pode colocar a disciplina em meio a outras da comunicação – e projetos de menor porte com verbas reduzidas, como os desenvolvidos para instituições culturais.

Neste ano, em vez de evento, a dupla está mais focada em montar um site que permita a postagem de conteúdo mais aprofundado. O Instagram foi o ponto de partida, mas para oferecer mais informações é preciso mais espaço. A intenção é futuramente montar um diretório de designers brasileiros pelo mundo. E organizar nova conferência em 2019.

Renovação de marca e conexão com o pós-digital

Leo Porto e Felipe Rocha desenvolveram o projeto de branding com a ℓiⱴε. O briefing foi o novo posicionamento da empresa, agora definida como uma agência pós-digital. A ideia era mostrar que a ℓiⱴε trabalha para engajar pessoas, derrubando barreiras entre o físico e o digital. “Algo já presente no trabalho da agência é o approach humano e transparente, com uma visão mais progressista. Queriam novo logo, novo design para o site”, diz Leo. Felipe destaca o briefing bem detalhado e com consistência, um cuidado que faz diferença para o resultado final.

Como se evidencia o conceito de pós-digital no projeto de branding? Leo explica que o pós-digital se relaciona com o fato de que “a tecnologia passa” pela pessoa. Ela está totalmente incorporada ao dia a dia e não nos torna reféns. O que se valoriza é a tecnologia que não isola a humanidade. Por sinal, “humana” foi uma das palavras mais usadas nas discussões de branding. O exercício foi traduzir essa essência no projeto.

No caso da tipografia, foi escolhida a fonte Times New Roman. Na década de 1980, ela foi licenciada como padrão para computadores, tornando a fonte a mais usada. Por isso, é considerada democrática. O logo feito com a Times New Roman traz outra vantagem: a fonte é lida em qualquer aplicação. Quem enviar o novo logo da ℓiⱴε por WhatsApp, por exemplo, irá visualizá-lo exatamente como é.

Foram usados caracteres especiais da Times New Roman para compor o logo. “Uma fonte é formada por vários caracteres. Pelo fato de ser uma das mais democráticas, ela tem muitos caracteres. Abrimos a biblioteca dessa fonte e usamos os caracteres menos tradicionais”, detalha Felipe.

Três cores também ressaltam a identidade da marca: branco no fundo, preto na tipografia e amarelo em destaques. O tom de amarelo surge também em ícones da cultura digital, como emoticons. Outro ponto importante do projeto é o valor que se deu à fotografia, que confere mais vida e calor à identidade. Como observa Leo, a proposta era evitar imagens muito posadas, com filtros e muita intervenção de Photoshop. “Se a ideia é ser humano, é preciso tirar a maquiagem”, pondera. Felipe reforça o ponto: “A gente acredita que a fotografia tem um papel mais expressivo e humano”. Com isso, buscou-se no projeto que ela tenha um ar de realidade, um ar mais documental. O resultado pode ser visto agora, neste site.

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